Você disse que nunca morreria dentro de mim, mas eu preferia que fosse ao contrário. Meus dias têm sido cansativos e repetitivos. São cinco e meia da tarde e eu ainda não tomei banho. Fico lembrando de como era bom acordar com você, mesmo em dias nublados. Hoje quando abri os olhos, te vi olhando pra mim ali do porta-retratos. Esfreguei os olhos e você continuava lá com essa cor castanha, os olhos grandes, me observando como se estivesse na cama comigo. O relógio tiquetaqueou perto do meu ouvido às seis da manhã. Parecia uma bomba querendo me avisar que você foi embora na hora errada e que a vida, de agora em diante, seria assim. Ando com os pensamentos entalados na cabeça, verbos parados na garganta e sorrisos que só chegam à metade de mim. A vida anda triste, me mandando recados pra continuar, me empurrando pra viver, mas sabe quando o corpo não movimenta e sorrir dói e olhos não querem abrir? Não sei quantas horas da noite passo olhando para o teto tentando entender esses sinais. Vai, diz ela pelo vento. Vai, diz ela pelas alegrias perdidas na rua. Vai, diz ela pela lua. E eu levanto, lavo o rosto, me encaro no espelho manchado e prometo ir. E prometo e repito pra dentro de mim, baixinho, com fé, pedindo a Deus. Dedos cruzados para que dessa vez dê certo.